Serafina


- Ô manhê, ô paiê, por que é que vocês resolveram me chamar de Serafina? O que quer dizer serafina? Se-ra-fi-na. Nada. Não quer dizer nada. Absolutamente na-da. Alia, eu acho que a gente deveria escolher o próprio nome, depois que crescesse um pouco e se achasse com cara de alguma coisa. Mas com essa cara que o espelho mostra, ou não. A outra, aquela que a gente tem lá dentro, sabem?
- Ora Serafina...
É sério, mãe. Eu, as vezes, me acho com cara de alface. Uma alface verdinha e orvalhada, feliz por estar bem juntinho da terra. Outras vezes me acho com cara de ventania. Com vontade de passar varrendo todas as coisas que atrapalham a vida da gente.
- minha filha...
- mas, sabe, pai, se eu tivesse que escolher um nome só, para toda a vida, escolheria... bem, escolheria... já sei. Escolheria o nome de Luz. Luz do sol, Luz da lua, Luz da vela, Luz do lampião, Luz de lamparina... Luz simplesmente Luz. Mas uma luz sempre acesa.
- muita bem, dona Serafina alface Ventania da Luz acessa. Só que agora...
- Já sei, já sei. Ta na hora de dormir, né? Pensando bem, nome não quer dizer nada, não. Se eu não me chamasse Serafina, aposto que eu Isa ser do mesmo jeito que sou.
(...)
Cristina Porto. Se... Serafina? São Paulo, Ática, 1980.

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